O Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) está em vigor no Brasil desde 03 de Janeiro de 2022 mas, surpreendentemente, ainda é um “quase desconhecido” em sua essência.
Instituído pela nova Norma Regulamentadora n° 1 (NR 1), o PGR não é apenas um papel protocolar; ele é a espinha dorsal do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) nas empresas.
Para desmistificar o PGR, é fundamental reverter o erro conceitual de tratá-lo como um mero documento.
O PGR é um Programa, Não um Documento Isolado
O PGR é, antes de tudo, um programa dinâmico constituído para dar suporte e materializar o GRO. Ele é o meio pelo qual a organização planeja, implementa e avalia as ações contínuas de Segurança e Saúde no Trabalho (SST).
O programa PGR é documentado, no mínimo, por dois elementos centrais:
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O Inventário de Riscos (a base de conhecimento: o que existe de risco).
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O Plano de Ação (a base de planejamento: o que será feito).
O Calcanhar de Aquiles do PGR: A Incompletude nas Avaliações
O Inventário de Riscos deve ser um registro completo e contínuo dos perigos e riscos ocupacionais. A falta de abrangência nesse inventário é a principal razão pela qual muitos PGRs se tornam incompletos e não conformes.
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A Lacuna da Ergonomia (Risco Atual)
O PGR exige a integração de riscos de todas as naturezas. Isso significa que o Inventário deve contemplar os riscos ergonômicos. Por isso:
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Os resultados iniciais da avaliação de ergonomia devem ser incluídos, sendo a Análise Ergonômica Preliminar – ARP (conforme a NR-17) parte da documentação mínima exigida.
Muitos PGRs atualmente elaborados estão incompletos e vulneráveis à fiscalização por ignorarem a ARP.
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O Exercício de Futurologia: Os Riscos Psicossociais (Risco Iminente)
Em um exercício de futurologia, podemos prever que o próximo grande ponto cego do PGR será a omissão das avaliações dos Fatores de Riscos Psicossociais (FRPS).
Assim que entrar em vigor a obrigatoriedade de avaliar os FRPS (prevista atualmente para maio de 2026), os resultados dessas avaliações se tornarão outra documentação compulsória do PGR.
É fundamental que as empresas aprendam com a falha atual na ergonomia e comecem a se estruturar para os FRPS, evitando que, no futuro, seus PGRs sejam considerados omissos por negligenciarem riscos como sobrecarga de trabalho, assédio e má organização laboral.
Fim do GHE: O Foco na Caracterização do Processo
Outro ponto de ruptura trazido pelo PGR está na forma de caracterizar o ambiente de trabalho. O Inventário de Riscos Ocupacionais deve contemplar, no mínimo, informações sobre a caracterização dos processos e ambientes de trabalho.
O foco migrou da mera semelhança de exposição para a caracterização detalhada do ambiente e do processo produtivo.
A repercussão dessa forma de avaliar riscos transcende o PGR e afeta o PPP eletrônico. Esse é oriundo do Evento S-2240 do eSocial. Nele, a tag 19 requer “informações relativas ao ambiente de trabalho”. Nas tags seguintes é informado se esse ambiente é do próprio empregador ou está em estabelecimento de terceiros, qual a sua descrição e a das atividades desempenhadas.
Se avaliações de agentes nocivos forem efetuadas pelo conceito do GHE ela não considera o ambiente de trabalho, pois o fator determinante para a constituição de um GHE é a similaridade da exposição, e não a localização geográfica ou física.
Se o GHE agrupa trabalhadores que estão em locais físicos diferentes (ex: setor A e setor B), a empresa deve garantir que as informações de caracterização do ambiente inseridas no S-2240, para cada trabalhador, estejam corretas e detalhadas, mesmo que a medição de risco seja a mesma.
Exemplo Prático:
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Um trabalhador do Setor A e um do Setor B são classificados no mesmo GHE Ruído, pois suas exposições são idênticas.
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A avaliação quantitativa (nível de ruído) é a mesma para ambos e é inserida no S-2240 para os dois.
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No entanto, a descrição do ambiente de trabalho na tag respectiva do S-2240 deve refletir o local de cada um (Setor A para o primeiro, Setor B para o segundo).
Portanto, a avaliação feita por GHE pode ser utilizada, desde que os sistemas de gestão de SST da empresa consigam “desdobrar” essa informação do GHE para os campos individuais de ambiente de trabalho e agentes nocivos exigidos pelo leiaute do S-2240 para cada CPF.
Embora o conceito de GHE continue sendo uma ferramenta metodológica válida e essencial para a Higiene Ocupacional (garantindo que as amostras coletadas representem grupos), a tendência de SST atual é que o documento base (LTCAT, PGR) seja estruturado por Ambiente de Trabalho.
Dessa forma, a avaliação de risco no nível do ambiente se torna o método mais prático e razoável para garantir a aderência e a facilidade de envio dos dados ao S-2240, que exige a vinculação direta: Trabalhador ao Ambiente e esse ao Agente Nocivo.