Direito, medicina e ideologia: relação complexa

Postado em 07/04/2025
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O Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou ação contra o Conselho Federal de Medicina (CFM) devido ao Art. 10 da Resolução CFM 2.323/2022, que permite ao médico do trabalho contestar o nexo causal perante o INSS. O MPT argumenta que a norma viola direitos dos trabalhadores.
A 9ª Vara do Trabalho de Brasília-DF (TRT-10) julgou a ação improcedente, conforme a sentença disponível em:
https://portal.cfm.org.br/wp-content/uploads/2025/02/SentencaMPT.pdf.
A sentença transcende a mera análise jurídica, convidando a uma profunda reflexão sobre as motivações que impulsionam as decisões judiciais. Ao examinarmos o documento, dois parágrafos específicos, encontrados na página 8, emergem como pontos de destaque:
“Com efeito, a petição inicial parece partir de uma concepção ideológica, se não preconceituosa, da legislação. A julgar pelo repetido uso de expressões como “interesses outros do empregador”, “interesse personalíssimo do empregador, ordinariamente de viés econômico” e “interesse econômico estrito do empregador”, em contraposição aos interesses dos empregados, o Ministério Público parece colocar estes últimos em patamar hierárquico mais elevado, alinhando-os invariavelmente com interesses coletivos e com direitos fundamentais.
Cuida-se, porém, de precipitada generalização. O interesse de uma empresa obviamente não é, por definição, um interesse escuso ou mesmo contrário à ordem jurídica, assim como o interesse de um empregado em obter certo benefício previdenciário nem sempre gozará de proteção do ordenamento jurídico. Não se pode aquilatar a virtude ou juridicidade de uma pretensão apenas pela posição que o pretendente ocupa nas relações de trabalho. Justamente porque pretensões ilegítimas podem advir de quaisquer dos sujeitos da relação de emprego, não cabe ao administrador ou ao julgador inferir, aprioristicamente, que qualquer pretensão do empregador, seja ou não defluente de seu “interesse econômico”, mereça ser de pronto rechaçada”.
O magistrado, em suas ponderações, explicita a tensão entre a aplicação estrita do direito e a influência de visões de mundo e concepções ideológicas.
Essa análise crítica sugere que, em casos como o presente, a interpretação das normas e a aplicação do direito podem ser permeadas por perspectivas que transcendem a objetividade jurídica.
A ação do MPT, ao questionar a Resolução do CFM, revela a preocupação em garantir a proteção dos direitos dos trabalhadores, e a resposta judicial, por sua vez, explicita a necessidade de equilibrar os direitos dos trabalhadores com as prerrogativas dos profissionais da medicina, em um cenário em que as interpretações jurídicas podem divergir.
A análise da sentença evidencia a complexidade da relação entre direito, medicina e ideologia, especialmente no contexto das relações de trabalho.

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Médico Especialista em Otorrinolaringologia. Mentor Intelectual do software SIGOWEB, aplicação na web destinada à Gestão da SST, eSocial, GRO/PGR, Gestão do FAP e atual Diretor de Inovações.

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